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Há quem defenda a desregulamentação da profissão contábil brasileira. Na verdade, o mercado especulativo é um dos segmentos mais interessados em que os conceitos, a forma de registro contábil e os procedimentos de ajustes de ativos e passivos sejam determinados por entidades privadas e que o Estado deixe de intervir na forma de apurar os lucros ou prejuízos dos agentes econômicos e sociais.
Quando defendemos que o Estado deve continuar tutelando a contabilidade, mantendo sob sua responsabilidade a defesa e a proteção deste campo profissional, não se trata de tutelar o campo de estudo dos contadores, a ciência contábil, que se desenvolve através de pesquisas, estudos, observações, e, a partir das conclusões e comprovações, surgem novas normas, técnicas, procedimentos e princípios.
O Estado não deve controlar o desenvolvimento da ciência, mas dar legalidade aos conceitos dos elementos que formam o patrimônio, à forma de registro e aos ajustes contábeis, para dar sustentação jurídica aos contadores no exercício de suas atividades e para que os detentores das riquezas não as manipulem em proveito próprio, trazendo prejuízos à sociedade, aos trabalhadores e ao erário.
Explicando melhor: É pela forma como os ativos, passivos, despesas, receitas e custos são conceituados e registrados, e seus valores ajustados, que se apuram os resultados econômicos e financeiros dos agentes produtivos. Assim, dependendo da forma como se conceitua e como se faz estes registros e ajustes, pode-se transformar um agente deficitário em superavitário, e vice-versa. É por isso que não é do interesse dos especuladores que o Estado intervenha na contabilidade, mas que órgãos privados passem a gerir este campo. Isso lhes permitiria uma maior liberdade de ação.
Agora, se um mero ajuste do contador pode transformar uma empresa deficitária em lucrativa, não parece sensato que a normatização das técnicas de registros contábeis esteja sob a responsabilidade de um órgão privado.
Infelizmente, os especuladores encontraram aliados nesta empreitada pela desregulamentação da contabilidade nos próprios profissionais contábeis. Desta forma, se pôs em movimento, há bastante tempo, uma campanha pelo não cumprimento da obrigação institucional do Conselho. O Conselho de Contabilidade deixou de fiscalizar o campo profissional, se comportando como um órgão privado, e não como um órgão especial da autarquia pública (como é de direito), o que favorece a especulação (como no caso das empresas envolvidas na Lava Jato).
Caso o Estado não retome a sua obrigação constitucional de fiscalizar o exercício das profissões liberais, mantendo sob a sua tutela os conselhos profissionais, e, em especial, o Conselho Federal de Contabilidade, as informações contábeis dos agentes econômicos e sociais se tornarão inúteis (como já têm se tornado), servindo apenas para privilegiar interesses de particulares, em detrimento da sociedade e do povo brasileiro.
Salézio Dagostim é contador, pesquisador contábil, professor da Escola Brasileira de Contabilidade - EBRACON, presidente de honra da Confederação dos Profissionais Contábeis do Brasil - APROCON BRASIL, fundador e ex-presidente do SINDICONTA-RS e da APROCON CONTÁBIL-RS e responsável técnico pela Dagostim Contadores Associados (P. Alegre/RS) - salezio@dagostim.com.br.
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