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O último relatório Doing Business põe o Brasil na 159ª posição, mas ainda ocupando o posto de país com a maior burocracia fiscal do mundo, mesmo obtendo uma colocação pouco melhor frente à lista anterior. Comemorada pelo governo federal, a “façanha” descortinou mais uma obra de ficção criada no afã de se obterem números favoráveis. Celebrar ilusões, afinal, sempre esteve entranhado no jogo político nacional.
A “melhora” do Brasil no ranking se deu por causa da ampla reforma da Lei de Falências, realizada em 2005, associada à redução de 22% no custo do endividamento, bem como a um aumento de 39% no nível agregado de crédito. Porém, o Time to Comply, índice que mensura quantas horas por ano são necessárias para preparar, registrar e pagar impostos e contribuições, e que compõe o critério de Paying Taxes, permanece em 2.600 horas desde 2003.
Este indicador usa uma “empresa-modelo” como estudo de caso para medir custos tributários e trabalhistas e como eles afetam os resultados das companhias. Na prática, não se pode afirmar que as empresas brasileiras gastem, em média, 2.600 horas por ano para calcular e pagar impostos.
Por usar um padrão estabelecido por essa empresa-modelo, o estudo serve como parâmetro comparativo entre os 185 participantes do ranking. Por isso, estatisticamente pode-se afirmar que amargamos o maior custo de conformidade fiscal e trabalhista do mundo, nove vezes superior à média mundial.
A posição exageradamente comemorada se deve à piora de um país que estava à frente, e não propriamente à melhora do Brasil. Ora, até os mais incautos sabem que desenvolvimento de verdade se dá com educação, saúde, habitação, emprego, cultura, lazer e incentivo ao empreendedorismo.
Embora o relatório mostre que o Brasil subiu duas posições – da 121ª para a 123ª – no tempo gasto para se iniciar um negócio, este dado também é ilusório. Ao mesmo tempo, o estudo reforça nosso eterno problema em obter crédito, pois o país caiu da 105ª para a 109ª colocação nesse quesito.
Outro dado interessante está na recente pesquisa da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, feita em conjunto com o Banco Mundial e a Universidade College London. Mães que mantêm as crianças em creches conseguem elevar a renda familiar de 20% a 25%. Como faltam vagas, o mercado de trabalho deixa de absorver 3,9 milhões de trabalhadoras.
Em novembro último, provavelmente embalada por este cenário, a presidente Dilma Rousseff fez uma declaração, durante a abertura do XIV Congresso da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo, em Campinas, que me causou certa inquietação. Disse ela: “Não podemos informatizar a burocracia, temos de facilitar, porque a burocracia provoca custos e desperdícios".
Como fazer isso, visto que praticamente todas as iniciativas do governo, inclusive o SPED, se resumem a informatizar a burocracia? Ou seja, automatizar aquilo que não precisa ser feito!
Nossa burocracia surreal, além do óbvio custo que todos nós pagamos ao consumir produtos e serviços, cria outro efeito perverso: uma “reserva de mercado” que dificulta a concorrência e cria uma lacuna de atendimento e produtividade.
Recentemente, várias companhias globais anunciaram não pretender expandir seus negócios no Brasil, dadas as barreiras burocráticas. Na prática, sofremos todos por causa da pouca concorrência. Enfim, pagamos mais e recebemos menos.
Há efeitos ainda piores: corrupção endêmica e venda de favores, desvios de conduta beneficiados pela complexidade do sistema. Só teremos uma verdadeira transparência na arrecadação e na aplicação dos recursos quando as regras forem claras o bastante para que cidadãos comuns possam entendê-las.
Implantado gradualmente desde 2007, o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) é uma ferramenta que poderá ajudar a melhorar esta situação. A partir deste ano, por exemplo, passará a operar com o eSocial, seu mais complexo e ambicioso subprojeto, e unificará o envio ao governo de informações previdenciárias, trabalhistas e fiscais. Haverá menos brechas para burlar a lei. Contudo, sem uma grande redução da complexidade regulatória, o SPED é tão útil à sociedade quanto uma moderna embarcação no rio Tietê.
Não é à toa que nosso crescimento econômico míngua a cada trimestre –expansão de apenas 1,5% no primeiro; 0,6% no segundo; menos 0,12% no terceiro. Sem as reformas tributária, previdenciária e trabalhista, certamente veremos novos índices nestes patamares, comprovando, na prática, que “pacotes de bondade” só existem para “brasileiro ver”. De outra forma, ficaremos apenas aguardando qual será o próximo mensalão, mensalinho, financiamento ilícito de campanha ou quadrilha de auditores fiscais.
() Roberto Dias Duarte é administrador, membro do GT de Tecnologia do CRC-MG e coordenador do MBA Empreendedorismo Contábil no B.I. International.
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