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Há no Código Tributário Nacional um dispositivo muito conhecido entre aqueles que atuam na seara do direito tributário, prevendo a exclusão da responsabilidade aos contribuintes que, espontaneamente e antes de qualquer procedimento de fiscalização, denunciem ao Fisco sua demora, efetuando, "se for o caso", o pagamento do tributo.
Em outras palavras, a lei determina a impossibilidade de aplicação de penalidade pelo atraso, sempre que o contribuinte se antecipe, demonstrando e sanando seu inadimplemento, antes de qualquer movimentação da administração tributária.
Esse instituto, indicado nos meios acadêmicos apenas como denúncia espontânea, foi sendo moldado pela jurisprudência ao longo dos anos, tendo sido objeto de muitas discussões nos tribunais. Assentou-se que o pagamento do tributo em atraso realizado mediante parcelamento de débitos não enseja a exclusão da penalidade, já que a expressão "se for o caso" não indicaria a possibilidade de o contribuinte abster-se de quitar integralmente o tributo. Consolidou-se, também, a impossibilidade de manejo do instituto para exclusão de multa por atraso na entrega de obrigações acessórias, situação que os contribuintes entendiam como apta a ser abrangida pela já indicada expressão "se for o caso". Seria justamente na hipótese de realização de denúncia espontânea de obrigações acessórias que não seria o caso de pagamento - o contribuinte apenas entregaria sua declaração ou prestaria a informação devida. Diante destes dois posicionamentos, foi inevitável o questionamento: quando será, então, o caso de realização de denúncia espontânea sem pagamento do tributo? Isso diante da premissa de que o pagamento, como já indicado, é condição para configuração da denúncia apenas "se for o caso". A questão, no entanto, seguiu sem resposta, restando consignado, também nesta hipótese, a inaplicabilidade do instituto.
Mais grave do que isso, no entanto, parece ser o entendimento que vem sendo consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos últimos anos quanto à impossibilidade de manejo da denúncia espontânea nos chamados tributos sujeitos ao lançamento por homologação (quando a legislação atribui ao contribuinte o dever de apurar, declarar e antecipar, sem qualquer participação do Fisco, o pagamento do tributo, sendo esta a roupagem que a esmagadora maioria dos tributos brasileiros atualmente ostenta).
É que nesses casos, a jurisprudência é no sentido de não reconhecer a aplicabilidade da denúncia espontânea, sempre que o contribuinte já tiver declarado ao Fisco o tributo devido. A denúncia espontânea até poderia ser aplicada aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, desde que o contribuinte nada tenha declarado ao Fisco. Segundo a Súmula nº 360 do STJ, "o benefício da denúncia espontânea não se aplica aos tributos sujeitos a lançamento por homologação regularmente declarados, mas pagos a destempo".
Isso quer dizer que este importante instituto, segundo a linha de entendimento que prevalece, só pode ser aplicado para a grande maioria dos tributos, na hipótese de o contribuinte não ter nem mesmo remetido ao Fisco as suas declarações de débitos (DCTF, DIPJ, GFIP e GIA). Caso esteja inadimplente, mas tenha declarado ao Fisco os tributos devidos, o contribuinte terá fechado a porta da denúncia espontânea.
Prestigia-se com esse entendimento, no entanto, o contribuinte marginalizado, aquele que nem mesmo declara seus débitos ao Fisco, reprimindo e estancando a regularização de débitos inadimplidos de contribuintes cumpridores de suas obrigações acessórias.
Essa construção, apesar de afetar de maneira firme a natureza indutora do instituto da denúncia espontânea, carregando em si uma clara incoerência interna de estímulo à má-fé e à desídia de certos contribuintes, vem sendo sustentada pelo STJ em virtude da fixação de premissa pelo tribunal de que as declarações de débitos fornecidas pelos contribuintes constituem o crédito tributário - podendo, inclusive, ser remetido à dívida ativa, independentemente de qualquer procedimento do Fisco. Mesmo que assim se entenda, deveria o STJ permitir o manejo da denúncia espontânea enquanto não inscrito o débito em dívida ativa.
Caso não haja uma mudança nessa sucessão de entendimentos, como se percebe, perdurará o estímulo à inaplicabilidade do instituto, isolando-o, salvo em raras exceções, como mecanismo de salvaguarda de contribuintes não cumpridores de quaisquer de suas obrigações e impedindo sua utilização pelo bom pagador que, tendo declarado seu débito ao Fisco, procura restaurar espontaneamente sua regularidade fiscal.
Colocados nestes moldes, fica o presente texto como singelo manifesto em prol da revitalização da denúncia espontânea, tomado como instituto indutor, atual, eficiente e fomentador de boas práticas pelos contribuintes brasileiros em um contexto de integração com o Fisco.
Diego Bomfim é advogado do escritório Machado Meyer e mestre em direito tributário pela PUC-SP
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