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Atualmente, muito se tem comentado sobre as chamadas "novas regras contábeis", as quais tiveram início com a publicação da lei nº 11.638/07 e foram reforçadas em dezembro do ano passado com a Medida Provisória 449. Dentre mortos e feridos, sobreviveram todos, mas não sem gerar muita confusão e dúvidas quanto a aspectos particulares que permaneceram obscuros na redação legal e que exigiram dos profissionais da Contabilidade um esforço sem precedentes em direção à atualização. Por mais pleonástico que possa soar, comecemos do começo, o dia 28 de dezembro de 2007, quando foi publicada a tão aguardada lei nº 11.638, a "nova lei contábil", como muitos a rotularam devido às expressivas alterações desta no maior instrumento regulador das empresas constituídas sob a forma de Sociedade Anônima, a lei nº 6404 de 15 de dezembro de 1967, a qual legisla sobre, dentre outros temas relacionados a este tipo societário, as práticas contábeis neste tipo de entidade, as quais, por sua vez, são tidas por uma grande parte dos profissionais e estudiosos da contabilidade como norteadoras da escrituração contábil em todos os tipos de pessoa jurídica.
Várias das alterações trazidas por este novo instrumento legal já podiam ser previstas pelos profissionais da área e não trouxeram grandes surpresas, como foi o caso da extinção da obrigatoriedade de elaboração da Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos (DOAR) e a instituição da Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) e da Demonstração do Valor Adicionado (DVA), mudanças já esperadas devido ao declarado desejo político de harmonização das práticas contábeis com as normas internacionais elaboradas pelo IASB, o que acabou por se enfatizar ainda mais com a criação da MP 449/08. No entanto, alguns pontos da, como foi amplamente divulgada, "nova lei das S/A" permaneceram na obscuridade da confusão gerada por uma redação um tanto quanto vaga, o que exigiu (e, diga-se de passagem, ainda exige) um grande esforço dos órgãos regulamentadores na tentativa de desvendar e preencher as lacunas no texto legal, demandando uma grande quantidade de pronunciamentos, resoluções e regulamentos em geral. Neste artigo iremos nos ater a uma das alterações que mais gerou divergência de opiniões e interpretações: o "desaparecimento" da conta Lucros Acumulados.
Com a nova redação dada à lei nº 6404/76, a supracitada conta não mais poderá figurar no Patrimônio Liquido das Sociedades Anônimas, salvo se a caráter transitório, devendo ter seu saldo destinado até a data de encerramento do Balanço Patrimonial. A extinção dos chamados lucros acumulados instituiu-se como forma de garantir aos acionistas, em especial os minoritários, a não retenção deliberada dos resultados, o que, conseqüentemente, causaria uma redução na distribuição de dividendos. Ainda antes da lei 11.638/07, os legisladores já se demonstravam preocupados com o excesso de lucros retidos, como se pode notar em outras instrumentos legais, tal qual a lei nº 10.303/01. A principal questão, no entanto, refere-se à necessidade da omissão deste instrumento contábil nas empresas constituídas sob a forma de sociedade limitada, já que, presume-se, em uma entidade deste tipo existe uma maior proximidade entre os sócios, podendo os mesmos optar facilmente, em comum acordo, por não destinar os lucros. Acontece que, como já foi afirmado anteriormente, para muitos estudiosos e profissionais da ciência contábil, o padrão legal para a elaboração das demonstrações contábeis de todos os tipo de sociedade deve ser aquele adotado pelas Sociedades por Ação.
A própria Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Autuarias e Financeiras (FIPECAFI), uma das maiores fundações de pesquisa em Contabilidade do Brasil, em seu FAQ sobre as alterações provocadas pela lei 11.638/07 comenta que, de acordo com o Decreto-lei n. 1.598/77, as sociedades limitadas que optarem pela tributação na modalidade do Lucro Real devem seguir os mesmos padrões de escrituração das S/A. Ainda no mesmo documento, a FIPECAFI recomenda que as sociedades não tributadas pelo lucro real também elaborem a sua escrituração seguindo a lei 6.404/76 e, conseqüentemente, as alterações da lei 11.638/08. Quanto ao Decreto-lei 1.598/77, utilizado para "justificar" a obrigatoriedade de obediência das sociedades limitas à forma de escrituração das S/A, cabe ressaltar que, como defende SÁ (2009), "o artigo 67 do Decreto-lei nº 1.598, de forma hialina estabelece que %u2018o lucro líquido do exercício deverá ser apurado, a partir do primeiro exercício social iniciado após 31 de dezembro de 1997, com observância das disposições da lei nº 6.404/76%u2019". Em outras palavras, o que o aludido instrumento legal determina é que, no caso da opção pelo Lucro Real, o resultado do exercício seja apurado com obediência às normas das S/A, não instituindo em momento algum regras quanto à estrutura do Balanço Patrimonial ou quaisquer outras demonstrações financeiras. Vale ressaltar ainda que não só de leis é constituído o arcabouço normativo a ser seguido pelos contabilistas.
Embora exista uma estrutura hierárquica a ser obedecida, na falta de regulamentação legal contrária, os profissionais de contabilidade devem obedecer a outros preceitos como, por exemplo, as Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC) e as resoluções editadas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC). Deste modo, considerando a já comentada omissão legal quanto à obrigatoriedade da não figuração da conta lucros acumulados no Balanço Patrimonial de sociedades limitadas (com exceção das consideradas de grande porte pela lei n. 11.638/07, as quais, de acordo com o art. 3o da referida lei, devem seguir as mesmas disposições que as S/A), recorre-se à redação da resolução CFC nº 1.157 de 13 de fevereiro de 2009, a qual institui: "115. A obrigação de essa conta (Lucros e Prejuízos Acumulados) não conter saldo positivo aplica-se unicamente às sociedades por ações, e não às demais, e para os balanços do exercício social terminado a partir de 31 de dezembro de 2008...". Assim, torna-se evidente que, para o CFC, principal órgão fiscalizador da profissão contábil no Brasil, as sociedades limitadas podem continuar mantendo o saldo positivo de sua acumulação de lucros no Patrimônio Líquido. Embora possa até não ser o tratamento mais adequado, a não destinação dos lucros é um direito dos sócios quotistas (desde que em comum acordo), por isso defende-se a continuidade da conta lucros acumulados, instrumento contábil que durante anos se mostrou eficaz neste tipo de sociedades.
Este artigo não visa, entretanto, desmerecer os dispositivos legais reguladores das S/A, muito menos as opiniões de nossos ilustres colegas defensores da padronização contábil total entre todos os tipos societários, mas sim desenvolver nos profissionais e estudiosos o senso crítico necessário para interpretar corretamente as normas que regem a nossa profissão e produzir serviços de maior qualidade para os usuários da informação contábil, atendo-se sempre, é claro, aos aspectos legais. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. BRASIL. Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007. CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Resolução nº 1.157 de 13 de fevereiro de 2009. FIPECAFI. FAQ das alterações da lei 11.638/07. (Disponível em http://www.cfc.fipecafi.org/faq/faq.pdf) SÀ, Antônio Lopes de. Lei 11.648/07: Contabilmente não alcança a maioria absoluta das empresas nacionais. (Disponível em http://www.lopesdesa.com.br)
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